Brasil e frica do Sul
Os primeiros contatos entre o Brasil e a África do Sul remetem ao período colonial, de modo que, durante esse período, as relações entre os dois países estiveram atreladas aos interesses europeus – primeiro aos dos portugueses, depois aos dos holandeses e aos dos britânicos. Com o fim do tráfico negreiro, na década de 1850, e, assim, da principal ligação que havia entre os dois lados do Atlântico, ocorreu um afastamento entre o Brasil e a África do Sul. Desde então, e até meados do século XIX, apenas contratos comerciais esporádicos foram realizados, evidenciando um claro retrocesso nas relações.
Na década de 1990, o fim do apartheid marcou uma nova fase nas relações da África do Sul com o resto do mundo e, consequentemente, com o Brasil. Nessa época, criou-se uma atmosfera de otimismo no que se refere ao processo político sul-africano, uma vez que este indicava uma tendência à superação dos conflitos que há décadas assolavam o país. Frente a essa nova conjuntura interna, o Ocidente se reaproximou da África do Sul, e o Brasil seguiu a tendência internacional, retomando suas relações com o país em um patamar político de mais alto nível.
A partir do ano de 1998, alguns países da África, como Nigéria, Senegal, Argélia, Moçambique, Tanzânia e Gana, liderados pela África do Sul, passaram a buscar uma maior representação das lideranças africanas nos assuntos mundiais. “Os Estados organizam-se numa espécie de ‘concerto de poderes’, desempenhando papéis políticos inovadores no continente em busca de uma agenda continental e internacional que de uma vez por todas fosse trabalhada por e de propriedade dos africanos”. Esta agenda incluía a construção da ordem continental a partir de uma perspectiva africana, priorizando a renovação nos campos da política, da economia, do desenvolvimento e social. A África do Sul, ao assumir, de certa maneira, a responsabilidade por coordenar as estratégias dessa nova polícia africana, trabalhou para conquistar a confiança e a cooperação dos outros países do continente e também fora dele.
Nos primeiros anos do século XXI, a nova África do Sul já emergia como parceira importante para o Brasil. Ainda no ano de 2000, os países membros do MERCOSUL (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai) firmaram um Acordo Preferencial de Comércio com a União Aduaneira da África Austral (SACU, na sigla em inglês). Esse acordo-quadro, que abrange duas regiões em desenvolvimento, cobre uma faixa de mil produtos selecionados com uma margem de redução de tarifas que pode variar de 10% a 100%, reforçando a cooperação e a integração Sul-Sul e destacando-se por ser o primeiro acordo concluído pela SACU enquanto entidade .
Em 2001, o economista Jim O’Neill do grupo financeiro Goldman Sachs criou o anacrônico BRIC para se referir ao grupo de países subdesenvolvidos composto por Brasil, Rússia, Índia e China. Em 2009, os países apostados compraram a ideia ao criar uma cúpula de coalizão. Em 2010, porém, devido às semelhanças entre o estágio de desenvolvimento da África do Sul e dos outros países que até então compunham o grupo político BRIC, e devido à sua proeminência no IBAS, o país foi incorporado ao grupo que, a partir de então, passou a se chamar BRICS. Atualmente, ele se constitui, portanto, como um fórum onde Brasil e África do Sul gozam de espaço para discutir seus interesses comuns e para levar as suas demandas comuns para a comunidade internacional.
Em junho de 2003, uma iniciativa sul-africana para a cooperação Sul-Sul nos âmbitos político, estratégico e econômico resultou no estabelecimento do Fórum de Diálogo Índia, Brasil e África do Sul – o IBAS, com o objetivo de examinar temas da agenda internacional e de interesse mútuo.
A cooperação entre os dois países não se restringe, no entanto, apenas à esfera do IBAS e do BRICS. Parte dessa cooperação é, inclusive, anterior à criação dos fóruns. No campo das políticas públicas, o Brasil iniciou sua luta por quebrar os direitos de patente dos medicamentos para o HIV-AIDS, ainda no governo FHC. várias frentes de cooperação se somam entre os dois países no combate à pobreza e às epidemias (especialmente do HIV-AIDS), na introdução e geração de tecnologias adaptadas aos problemas do Terceiro Mundo e na aliança ativa nos fóruns multilaterais – G-3 e G-20 – em defesa de interesses comuns na busca do desenvolvimento e da construção de um sistema mundial multipolar e pacífico.
Referências:
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